quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Às favas! (texto chato de ler e escrever, texto óbvio, mas que eu precisava escrever)

O nome dele é Luis. Luis é um homem de esquerda, sempre foi ligado às questões de seu partido e resolveu estudar ciência política porque queria ajudar as causas políticas que acreditava. Além desse histórico de pessoa preocupada com o que acontece "no partido", ele se mostrou completamente repartido, entre fala e ação. Mas isso eu falo depois. Além do que vou falar depois, Luis é DIRETOR, sim, sim, ele é o diretor do clubinho do leitor da escola de seu filho.

Abre parenteses.

Como funciona o clubinho do leitor?

O clubinho do leitor fica na casa do Luis, ele ocorre mais precisamente na biblioteca da casa do Luis. Lá tem muuiiitos livros, e dentre esses muitos são infantis. Três vezes por semana os alunos da escola onde o filho do Luis estuda, vão até a casa de Luis para pegar livros emprestados e contar sobre os livros que leram durante a semana. Então acontecem seminários, segundas são as séries iniciais, quartas as séries intermediárias, e sextas as séries finais... no decorrer eu falo mais sobre a diretoria do clubinho.

Fecha parenteses.

Então, além de diretor do clubinho o Luis também é funcionário de um supermercado, ele é empacotador por escolha. Acreditem se quiserem, nesta estória as pessoas escolhem ser empacotadoras porque trabalhar em hipermercado é muito importante e existe até concurso para isso, então o Luis apesar da ciência política, estudou com afinco para ser funcionário do hipermercado e "se deu bem", fez a escolha do salário garantido.

Eu sou eu, estava na rua sentada no banco da praça, pensando porque as mulheres não possuem a cultura de fumar cachimbo e os homens estão a perdê-la. Pensando, pensando e pensando. O Luis chegou, sentou a meu lado e me falou assim:

Estou no intervalo do hipermercado, sou empacotador. Você nem me conhece, nem faço questão que me conheça, estou conversando com você porque este é o único banco da praça e sentar ao seu lado e não falar absolutamente nada ficaria muito chato, então quero lhe dizer que não sou do tipo de fazer algo para parecer chato, desse modo eu sigo o protocolo, mesmo sem ter vontade de conversar com você (detalhe, Luis não percebeu que falar assim também ficava chato, e foi um bunda mole por não assumir sua postura, e cometeu o ato falho de escapar sua postura pela fala, pobre Luis, tanta vontade de seguir o protocolo...).

Não falei nada, porque não quis, e ponto.

Luis voltou a falar, me disse que estava cansado no supermercado, que lá tinham muitas pessoas e que tudo era estressante: tinha que empacotar 200 sacolas e 10 min., separar as sacolas por tipo de alimentos e produtos de higiene e limpeza, além de ter que falar com os colegas, ter que falar com os clientes, e ter um supervisor de função sempre no seu pé, e um chefe (DIRETOR) que esporadicamente entrava em contato apenas para fazer cobranças.

Continuei quieta.

Luis então me contou do clubinho da leitura. Disse que no início do ano fazia a lista dos livros que cada aluno deveria ler, organizava a ordem dos seminários onde estava incluso o tempo de apresentação e uma avaliação de clareza e dicção. Todos tinham que corresponder as expectativas de Luis, caso contrário, ficariam suspensos do clubinho (talvez todos quisessem ser suspensos), porém junto da suspensão o Luis conseguiu um modo de a mesma diminuir a média do aluno e este poderia até rodar de ano (pobre Luis, utilizando esses mecanismos de controle, boicotando a criatividade e a autogestão e...).

Não me contive e perguntei:

Tu faz alguma coisa a respeito do teu trabalho?

O mais rápido possível ele me responde: claro que faço, sou filiado ao partido, e lá aprendi pelos meus direitos e então sempre faço passeatas, faço greve, arranjo pessoas para se unirem à causa.

POBRE LUIS, NÃO RENUNCIA A DIREÇÃO NEM POR UM MINUTO, AMA O PODER, E NÃO SABE FAZER NADA DIFERENTE DO QUE REPRODUZIR O AUTORITARISMO QUE ESTÁ INSTITUCIONALIZADO NELE PRÓPRIO, mas o pior é que ele não pode deixar ficar chato, então ele nega pra todo mundo através de seu envolvimento com a política e as causas trabalhistas (mais uma vez suas ações representam o ato falho e a bunda do Luis deve ser bem mole mesmo).


Luis acorda: você não briga com seu emprego, a briga é contigo mesmo.

Luis foi embora, disse tiau para não ficar chato.

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