Eu estou com um rombo.
Aqueles buracos enormes que insistem em não fechar, independente do tempo.
O machado atingiu bem aqui no peito.
E eu estou parada esperando. Não me movimento muito, vá que perca todo o meu sangue e morra.
Fico parada esperando o tempo. É uma dor que não passa. Uma tristeza sem fim. Sou só. Só buraco.
O buraco me engoliu por inteira e estou sem ar, sem visão e sem raciocínio. Sou dor, dor e dor.
Perdi tudo. Meus batimentos estão se indo. E eu?
Eu espero o tempo. Um milagre. Pode ser um médico ou um mágico.
Espero deus, não tenho cura.
segunda-feira, 17 de novembro de 2014
segunda-feira, 3 de novembro de 2014
Porto Alegre
Essa coisa de viver em ciclos, ainda vai me deixar sem ninguém!
Minha vida se redefine a cada dois ou três anos, esses são meu ciclos.
Agora em um novo momento, mais um vez no recomeço.
Agora eu vou procurar aquele grupo de teatro que eu adiei porque pensei que voltaria.
Agora vou procurar o pessoal do treino de corrida, porque pensei que voltaria.
Agora vou comprar umas alpargatas, porque pensei que não precisaria.
Agora vou gastar menos dinheiros, porque pensei que gastaria.
Agora vou andar mais na rua, porque pensei que era tristeza.
Agora vou quebrar as paredes, porque pensei que jamais sorriria.
Agora vou olhar nos olhos, porque pensei que eram ocos.
Agora vou respirar fundo e celebrar a vida, porque pensei que era morte.
Agora vou buscar família
Agora vou achar abraço
Agora vou transpor o espaço
porque agora sou afeto desinibido
Agora vou ter amigos
Porque agora é aqui que vivo.
Minha vida se redefine a cada dois ou três anos, esses são meu ciclos.
Agora em um novo momento, mais um vez no recomeço.
Agora eu vou procurar aquele grupo de teatro que eu adiei porque pensei que voltaria.
Agora vou procurar o pessoal do treino de corrida, porque pensei que voltaria.
Agora vou comprar umas alpargatas, porque pensei que não precisaria.
Agora vou gastar menos dinheiros, porque pensei que gastaria.
Agora vou andar mais na rua, porque pensei que era tristeza.
Agora vou quebrar as paredes, porque pensei que jamais sorriria.
Agora vou olhar nos olhos, porque pensei que eram ocos.
Agora vou respirar fundo e celebrar a vida, porque pensei que era morte.
Agora vou buscar família
Agora vou achar abraço
Agora vou transpor o espaço
porque agora sou afeto desinibido
Agora vou ter amigos
Porque agora é aqui que vivo.
quarta-feira, 2 de julho de 2014
Ainda não tem título
Já estou com minha senha, estou aqui parada, olhando ao redor, é tudo cinza e amarelo. As mesas são de fórmica, cinzas, com detalhes em amarelo, também tem vidros enfumaçados para que assim o cliente não veja a cara de que lhe atende. Grande bosta, eles nem acertam meu nome, de que me serve ser vista por essa gente? De um lado ficam as escrivaninhas e do meio do salão até a outra parede ficam as cadeiras, bem no meio tem um pilar, ali tem um aparelho que mostra a senha. Estou sentada a meia hora e minha senha é a 50, está na 45. Olha que eu sou preferencial hein, acho que nem essas senhas pra velhos funcionam, eu sempre espero o mesmo tempo. Espero a seco, porque aqui ninguém me dá nada, só me tiram, esses filhos da puta. O outro dia veio um querer me vender um seguro de vida, e eu disse que não, mas afinal, pra que me serve um seguro de vida se quando eu morrer não vou ficar com o dinheiro? Rá, inventam cada coisa, que eu rio por dentro, rio pra não esbofetear um. Juro que se tivesse músculos eu dava um soco, bem na fuça do primeiro imbecil que viesse me fazer uma proposta dessas de seguro, eu quebrava a cara dele todinha, arrancava os olhos e comeria mais tarde com molho e macarrão. Mas não dá, meu corpo tá todo caído e músculos eu nunca tive.
Ah, lembrei agora, lembrei de quando eu abri minha primeira conta no Banco do Brasil, era tudo tão diferente. Primeiro que eu era bonita, eu tinha uns peitos duros que fazia chover. Eu entrava no banco e o gerente já biscava, eu como sempre fui puta, retribuía é claro, ainda mais que era o gerente, eu sempre ganhei muita coisa só pela piscadinha.
Tinha também a Gorete, ela era da limpeza, ficava numa alegria de me ver. Sempre fui mulher independente, quem cuidava da conta da família era eu, até porque o Cesar me deixou com os dois filhos pra criar e foi correr mundo, ou eu cuidava ou me fudia, no fim aconteceu os dois, cuidei de tudo e me fudi junto. Uma fudida de peito duro, até que valeu a pena. Melhor que aguentar ver o Carlos ficar broxa, foi melhor assim.
A Gorete, eu colocava o pé na porta e ela vinha com um cafezinho. Agora fiquei pensando, será que ela gostava de mim ou o gerente que mandava o café? Nunca tinha pensado nisso, sempre acreditei que ela me achava simpática e por isso fazia o que fazia, ela também podia ser machorra. Nossa eu me considerava puta e essas coisas nunca tinham me passado pela cabeça, to vendo que puta eu sou agora. Mas de que adianta, agora?! Ah, desgraça esse tempo, não passa nunca e minha senha nada.
Puta, puta mesmo eu nunca fui, mas na minha época, piscar pra rapaz já era putaria, fui chamada de puta pela minha mãe sem nunca ter trepado, desde novinha já me chamavam de puta na família. Primeiro fiquei triste, mas depois eu descobri as vantagens do apelido. Agora eu me intitulo sem nunca nem ter tido outro homem além do Cesar, criei dois filhos, mas se tenho peito sou puta! Vai entender?!
Chamaram minha senha, finalmente.
O gerente, mal olha pra mim, tá vidrado na tela do computador, pediu meu CPF, mostrei o papel pra ele porque nunca fui boa de decorar números. Ele agora tá engasgando com meu nome e eu já repeti três vezes Silvia Salsa Silva, maldito dia que minha mãe escolheu o nome de Silvia, já não bastava os outros ésses do nome? Se minha mãe fosse viva eu juro que matava aquela vadia. Primeiro me encheu de S, depois me apelidou de puta, e eu carrego tudo até hoje. O cachão é o lugar dela, velha desgraçada. Quando eu morrer não quero que me enterrem perto dela. Já avisei a Paulinha e o Ricardo, lá na Vila Mariana eu não quero ser enterrada, se puderem me enterrem em Curitiba, porque eu mereço cidade boa, me enterrem e nem precisa ir lá me visitar, até porque não vou poder conversar com vocês, não que eu goste de conversar, odeio interagir, mas viajar de Santa Catarina até o Paraná e nem bater um papinho, me enterra lá e me esquece por lá.
A Paulinha chora, sempre foi chorona. Maldito dia que tive essa pirralha, não cresceu nunca. O Ricardo não tá nem aí, ele quer é meu apartamento o desgraçado, puxou ao pai. Garanto que vai ter os filhos e deixar por aí.
- É Silvia Salsa Silva.
Ah, lembrei agora, lembrei de quando eu abri minha primeira conta no Banco do Brasil, era tudo tão diferente. Primeiro que eu era bonita, eu tinha uns peitos duros que fazia chover. Eu entrava no banco e o gerente já biscava, eu como sempre fui puta, retribuía é claro, ainda mais que era o gerente, eu sempre ganhei muita coisa só pela piscadinha.
Tinha também a Gorete, ela era da limpeza, ficava numa alegria de me ver. Sempre fui mulher independente, quem cuidava da conta da família era eu, até porque o Cesar me deixou com os dois filhos pra criar e foi correr mundo, ou eu cuidava ou me fudia, no fim aconteceu os dois, cuidei de tudo e me fudi junto. Uma fudida de peito duro, até que valeu a pena. Melhor que aguentar ver o Carlos ficar broxa, foi melhor assim.
A Gorete, eu colocava o pé na porta e ela vinha com um cafezinho. Agora fiquei pensando, será que ela gostava de mim ou o gerente que mandava o café? Nunca tinha pensado nisso, sempre acreditei que ela me achava simpática e por isso fazia o que fazia, ela também podia ser machorra. Nossa eu me considerava puta e essas coisas nunca tinham me passado pela cabeça, to vendo que puta eu sou agora. Mas de que adianta, agora?! Ah, desgraça esse tempo, não passa nunca e minha senha nada.
Puta, puta mesmo eu nunca fui, mas na minha época, piscar pra rapaz já era putaria, fui chamada de puta pela minha mãe sem nunca ter trepado, desde novinha já me chamavam de puta na família. Primeiro fiquei triste, mas depois eu descobri as vantagens do apelido. Agora eu me intitulo sem nunca nem ter tido outro homem além do Cesar, criei dois filhos, mas se tenho peito sou puta! Vai entender?!
Chamaram minha senha, finalmente.
O gerente, mal olha pra mim, tá vidrado na tela do computador, pediu meu CPF, mostrei o papel pra ele porque nunca fui boa de decorar números. Ele agora tá engasgando com meu nome e eu já repeti três vezes Silvia Salsa Silva, maldito dia que minha mãe escolheu o nome de Silvia, já não bastava os outros ésses do nome? Se minha mãe fosse viva eu juro que matava aquela vadia. Primeiro me encheu de S, depois me apelidou de puta, e eu carrego tudo até hoje. O cachão é o lugar dela, velha desgraçada. Quando eu morrer não quero que me enterrem perto dela. Já avisei a Paulinha e o Ricardo, lá na Vila Mariana eu não quero ser enterrada, se puderem me enterrem em Curitiba, porque eu mereço cidade boa, me enterrem e nem precisa ir lá me visitar, até porque não vou poder conversar com vocês, não que eu goste de conversar, odeio interagir, mas viajar de Santa Catarina até o Paraná e nem bater um papinho, me enterra lá e me esquece por lá.
A Paulinha chora, sempre foi chorona. Maldito dia que tive essa pirralha, não cresceu nunca. O Ricardo não tá nem aí, ele quer é meu apartamento o desgraçado, puxou ao pai. Garanto que vai ter os filhos e deixar por aí.
- É Silvia Salsa Silva.
terça-feira, 1 de julho de 2014
Saudade
A poesia morreu
declinou em minha memória
A poesia não vem
bateu a porta na minha cara
Ah, poesia desgraçada!
nem quando mais preciso te disfarças
Se eu pudesse eu te escreveria
Te mastigaria e te engoliria
E então te sentiria
te deglutiria e te expulsaria.
A poesia foi embora
não deixou nem endereço de chegada
Ah, poesia desgraçada!
declinou em minha memória
A poesia não vem
bateu a porta na minha cara
Ah, poesia desgraçada!
nem quando mais preciso te disfarças
Se eu pudesse eu te escreveria
Te mastigaria e te engoliria
E então te sentiria
te deglutiria e te expulsaria.
A poesia foi embora
não deixou nem endereço de chegada
Ah, poesia desgraçada!
quarta-feira, 25 de junho de 2014
Poesia
Poesia: Fernando Naporano
O silêncio do ar
parece rachar
o abandono
dos meus sentimentos
A cabeça conclusivamente vazia
ilha de fel feliz
resignada
sem soluções
sem as cercas dos dias
O olhar ao nível da terra
plenitude roxa
a arder de esquecimento
Nada ao lado de nada
é a pedra
a rigidez da sua lava
que afasta
quem contempla o rosto
•••
Luz eneblinada
quase faz com que o ar
se recolha dentro de si
Claridade insuspeita
egressa do cinza
rima hermética
inerte
num facho de sol
Minúsculo calor opaco
partículas de frágil resistência
onde a alma de pedra
boia
fita a neutralidade
de todas as coisas
e se apoia
•••
Propago-me lento
cada vez mais lento
além lesma
no silêncio da grama
A sabedoria do vazio
instala sua cama
na minha altura
Medito sobre as dissipações
sei da nudez sem rastros
das nuvens paradas
que ajudam o tempo
não passar entre os dedos
Fernando Naporano
terça-feira, 24 de junho de 2014
Reencontrando Dostoévski
Ontem estava muito ansiosa e para variar não conseguia dormir. Estou sempre cheia de tarefas, fazer mestrado é uma experiência única de produtivismo e falta de relação.
Então, estava eu entregue a esse cenário e com a ansiedade saindo por todos os poros, estava pensando nos prazos, no medo de perder a bolsa, no medo de não conseguir terminar e na difícil tarefa de criar algo que tem que ser sempre referenciado, caso contrário não possui valor científico.
Me lembro até hoje, quando falei para um grande amigo meu que eu havia passado no mestrado, por sinal o mesmo mestrado que ele tinha feito. Sabem o que ele me disse? Ele disse assim: "bom Marcelinha, serei o teu consultor para assuntos inúteis".
Hoje compreendo o que ele me falou, hoje vejo que as coisas, infelizmente, não possuem muito sentido por aqui. Tenho buscado muitos sentidos, e até encontro explicações racionais para meu momento de vida. Mas se eu pensar no sentido que gosto, o sentido que vem das relações e a compreensão dela, enfim, tudo o mais se torna assunto inútil. Tal qual meu amigo me alertou.
Pode parecer deprimente a minha forma de escrever, mas na verdade hoje lido com a realidade e sei os benefícios de passar pelo processo que estou vivendo. Isso é o que me consola.
Agora você pode estar pensando, mas o que Dostoévski tem a ver com isso?
Eu retorno àquele momento de ansiedade saindo pelos poros.
Estava eu, querendo dormir e sem conseguir e eis que penso: "Iniciei a leitura dos Irmãos Karamazov, e o produtivismo acadêmico fez com que eu me afastasse da leitura. Faz um mês que não leio nenhuma página do livro e estou louca para saber o que aconteceu com a família Karamazov após o encontro com o Mestre".
Não preciso dizer né?! Fui lá e peguei o livro novamente. Ainda não descobri o que aconteceu com a família, meu sono chegou antes. Mas nossa, Dostoévski sempre me fez bem! Me desliguei de tudo, me entreguei ao enredo, e por muitos momentos tive ódio/raiva de Fiodor, o pai dos irmãos Karamazov.
Ah, Dostoévski, como eu queria ter tempo para lhe ler mais. Ah, como é bom fazer o que se gosta, mesmo que não se tenha mais tempo (vida) para isso.
Abraço
Então, estava eu entregue a esse cenário e com a ansiedade saindo por todos os poros, estava pensando nos prazos, no medo de perder a bolsa, no medo de não conseguir terminar e na difícil tarefa de criar algo que tem que ser sempre referenciado, caso contrário não possui valor científico.
Me lembro até hoje, quando falei para um grande amigo meu que eu havia passado no mestrado, por sinal o mesmo mestrado que ele tinha feito. Sabem o que ele me disse? Ele disse assim: "bom Marcelinha, serei o teu consultor para assuntos inúteis".
Hoje compreendo o que ele me falou, hoje vejo que as coisas, infelizmente, não possuem muito sentido por aqui. Tenho buscado muitos sentidos, e até encontro explicações racionais para meu momento de vida. Mas se eu pensar no sentido que gosto, o sentido que vem das relações e a compreensão dela, enfim, tudo o mais se torna assunto inútil. Tal qual meu amigo me alertou.
Pode parecer deprimente a minha forma de escrever, mas na verdade hoje lido com a realidade e sei os benefícios de passar pelo processo que estou vivendo. Isso é o que me consola.
Agora você pode estar pensando, mas o que Dostoévski tem a ver com isso?
Eu retorno àquele momento de ansiedade saindo pelos poros.
Estava eu, querendo dormir e sem conseguir e eis que penso: "Iniciei a leitura dos Irmãos Karamazov, e o produtivismo acadêmico fez com que eu me afastasse da leitura. Faz um mês que não leio nenhuma página do livro e estou louca para saber o que aconteceu com a família Karamazov após o encontro com o Mestre".
Não preciso dizer né?! Fui lá e peguei o livro novamente. Ainda não descobri o que aconteceu com a família, meu sono chegou antes. Mas nossa, Dostoévski sempre me fez bem! Me desliguei de tudo, me entreguei ao enredo, e por muitos momentos tive ódio/raiva de Fiodor, o pai dos irmãos Karamazov.
Ah, Dostoévski, como eu queria ter tempo para lhe ler mais. Ah, como é bom fazer o que se gosta, mesmo que não se tenha mais tempo (vida) para isso.
Abraço
segunda-feira, 23 de junho de 2014
Encontro
Eram 10h, da madrugada, nosso encontro estava marcado. Aqueles encontros com hora de início e hora de fim.
Mas assim? E isso pode ser encontro?
Sim.
Eram 10h, e ela chegou, ela me olhou como nunca alguém olhou.
Ela me respeitou e não me viu com penar.
Ela entendeu que eu sou uma história e isso bastou.
Eram 10h30 e demos muitas gargalhadas,
gargalhadas que só acontecem nos encontros de verdade.
A gargalhada dela era a minha e a minha era a dela.
Esse foi o nosso encontro.
Mas assim? E isso pode ser encontro?
Sim.
Eram 10h, e ela chegou, ela me olhou como nunca alguém olhou.
Ela me respeitou e não me viu com penar.
Ela entendeu que eu sou uma história e isso bastou.
Eram 10h30 e demos muitas gargalhadas,
gargalhadas que só acontecem nos encontros de verdade.
A gargalhada dela era a minha e a minha era a dela.
Esse foi o nosso encontro.
sábado, 26 de abril de 2014
Tu
Quando eu olho para você
quando vejo os seus olhos
aparece uma pequena chama, quase se apagando
lá no fundo de seus olhos tristes
bem lá, perpassando a linha da solidão
tem uma pequena chama
que me chama e me diz, eu sou isso aqui.
Quando eu olho pra você
eu sinto a tristeza do mundo em mim também
quando vejo
eu entristeço e fico sem saber o que fazer
Quando eu olho pra você
eu rezo
peço com toda força à Deus que enxergues a luz
que cultives a chama.
Quando eu vejo você
me dói
vejo a criança que nunca foi cuidada
vejo a pessoa que pouco foi olhada
Quando eu olho pra você
eu pego um espelho
coloco na tua frente
você me diz que não vê nada
Eu me desespero, não sei o que fazer
não sei como chegar lá
não sei como fazer a chama crescer
e isso me inquieta
Quando eu olho pra você
eu formulo mil formas de espontaneidade
e você fica preso, parado, triste
Quando eu olho pra você
eu vejo você
eu e você
e penso
de onde tirarei forças?
Quando eu olho pra você
existe mais no fundinho ainda
um rosto de alguém que me diz
nunca me ensinaram
sinto tristeza
não sei o que fazer
então pergunto
o que posso fazer por você?
nunca perguntei a você
porque quando olho pra mim
eu vejo uma chama atrás dos meus olhos caídos.
quando vejo os seus olhos
aparece uma pequena chama, quase se apagando
lá no fundo de seus olhos tristes
bem lá, perpassando a linha da solidão
tem uma pequena chama
que me chama e me diz, eu sou isso aqui.
Quando eu olho pra você
eu sinto a tristeza do mundo em mim também
quando vejo
eu entristeço e fico sem saber o que fazer
Quando eu olho pra você
eu rezo
peço com toda força à Deus que enxergues a luz
que cultives a chama.
Quando eu vejo você
me dói
vejo a criança que nunca foi cuidada
vejo a pessoa que pouco foi olhada
Quando eu olho pra você
eu pego um espelho
coloco na tua frente
você me diz que não vê nada
Eu me desespero, não sei o que fazer
não sei como chegar lá
não sei como fazer a chama crescer
e isso me inquieta
Quando eu olho pra você
eu formulo mil formas de espontaneidade
e você fica preso, parado, triste
Quando eu olho pra você
eu vejo você
eu e você
e penso
de onde tirarei forças?
Quando eu olho pra você
existe mais no fundinho ainda
um rosto de alguém que me diz
nunca me ensinaram
sinto tristeza
não sei o que fazer
então pergunto
o que posso fazer por você?
nunca perguntei a você
porque quando olho pra mim
eu vejo uma chama atrás dos meus olhos caídos.
segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014
O controle e o caos
- Quantos canais tem sua televisão?
- todos da NET menos os de filme, sai muito caro.
- Quantos tu assiste?
- uns 13, sei lá.
- Tu sempre usa o controle para mudar de canal?
- mas é claro, que pergunta idiota. quem hoje em dia levanta para mudar o canal? em que mundo vives? por que tantas perguntas? se continuares, vou te dar um soco.
Ah, tamanha ira de Fabio, quando Lucíola lhe falou no controle.
"Pode parecer uma pergunta idiota, mas sei lá, minha falecida vó nunca se acertou com o controle remoto, achava que se usasse-o poderia tonar a TV inoperante, desse modo, ela pensava que se clicasse no botão de volume do controle remoto só poderia aumentar o volume pelo controle, até o momento que a TV seria desligada da tomada e religada a fim de que voltasse ao normal. Sei também que o Fabio não tem a idade que minha vó faleceu, ele é meu contemporâneo, não é a geração Y mas consegue lidar bem com tecnologias, mas que mal há em falar em controles? Talvez esse fosse o fio da meada para uma conversa, uma aproximação. Mas não! Esse controle acionou uma mola nele, que sei lá onde bateu, mas a reação foi... vou te dar um soco. Ah, desde que meu irmão foi morar sozinho, já não entendo-o mais. Enfim, vou tentando entende-lo aos poucos".
"ah, o que Lucíola pensa que é, vem aqui em casa e fica indagando tudo. sempre umas perguntas idiotas e óbvias, se ela ainda fosse pequena e eu também, juro que teria pulado no pescoço dela, dado uns socos no seu estômago até ela chorar, só pararia quando ela gritasse pai para ele vir me tirar de cima dela".
A noite chegou. Lucíola foi embora. Fabio deitou-se em sua cama, a cama era de casal, mas companhia não havia por ali, pegou seus dois controles, um da NET e o outro da TV. Ligou ambos e foi trocando os canais. Aos poucos ia pensando: não gostei, pula. esse assunto é chato, pula. esse programa é muito emotivo, pula. esse é de mulherzinha, pula. pulou tanto, fugiu tanto, tal qual fez com Lucíola. na TV ele não precisava ameaçar com soco. qualquer insatisfação fazia-o clicar no botão. socos imaginários em qualquer manifestação humana.
Como era Fabio? Nem ele sabia. Pesava mais de 180 quilos, no troca troca dos canais, ele comia um pouco para passar o tédio. Foi tanto tempo fugindo de tudo, que uma manta de gordura o separava do mundo, o separava até mesmo da televisão. E para ele bastava estar com o controle na mão e ir mudando. Com TV ou sem TV ele é que mandava no controle. Mas ao certo não sabia quem era, nunca tinha nem parado para pensar. Adoçava a vida com muito açúcar, dos mais diversos tipos, confeitos, sorvetes, bolos, etc. Balanceava o doce com um salgado, afinal como adoçar as amarguras se já está se sentindo doce ao extremo?
Fabio nunca parava, nunca olhava seus olhos no espelho, não compreendia a si. Não compreendia e nem tentava. Apenas comia.
Mas até os psiquismos mais inconscientes sentem dor. E na calada da noite, ele chorava. Chorava igual a um gatinho que quer deitar com seu dono em uma noite fria. Ele miava, porque chorar mesmo ainda não tinha aprendido.
Seu controle e seu miado. A única partícula de vida que sempre lhe dizia: você está aqui e Não há escapatória. Assim ele miava mais um pouco. Sentia seu estômago inchado de tanta comida e não sabia o que fazer. Miava, Miava, Miava. Ultimamente Miava em letra maiúscula.
- todos da NET menos os de filme, sai muito caro.
- Quantos tu assiste?
- uns 13, sei lá.
- Tu sempre usa o controle para mudar de canal?
- mas é claro, que pergunta idiota. quem hoje em dia levanta para mudar o canal? em que mundo vives? por que tantas perguntas? se continuares, vou te dar um soco.
Ah, tamanha ira de Fabio, quando Lucíola lhe falou no controle.
"Pode parecer uma pergunta idiota, mas sei lá, minha falecida vó nunca se acertou com o controle remoto, achava que se usasse-o poderia tonar a TV inoperante, desse modo, ela pensava que se clicasse no botão de volume do controle remoto só poderia aumentar o volume pelo controle, até o momento que a TV seria desligada da tomada e religada a fim de que voltasse ao normal. Sei também que o Fabio não tem a idade que minha vó faleceu, ele é meu contemporâneo, não é a geração Y mas consegue lidar bem com tecnologias, mas que mal há em falar em controles? Talvez esse fosse o fio da meada para uma conversa, uma aproximação. Mas não! Esse controle acionou uma mola nele, que sei lá onde bateu, mas a reação foi... vou te dar um soco. Ah, desde que meu irmão foi morar sozinho, já não entendo-o mais. Enfim, vou tentando entende-lo aos poucos".
"ah, o que Lucíola pensa que é, vem aqui em casa e fica indagando tudo. sempre umas perguntas idiotas e óbvias, se ela ainda fosse pequena e eu também, juro que teria pulado no pescoço dela, dado uns socos no seu estômago até ela chorar, só pararia quando ela gritasse pai para ele vir me tirar de cima dela".
A noite chegou. Lucíola foi embora. Fabio deitou-se em sua cama, a cama era de casal, mas companhia não havia por ali, pegou seus dois controles, um da NET e o outro da TV. Ligou ambos e foi trocando os canais. Aos poucos ia pensando: não gostei, pula. esse assunto é chato, pula. esse programa é muito emotivo, pula. esse é de mulherzinha, pula. pulou tanto, fugiu tanto, tal qual fez com Lucíola. na TV ele não precisava ameaçar com soco. qualquer insatisfação fazia-o clicar no botão. socos imaginários em qualquer manifestação humana.
Como era Fabio? Nem ele sabia. Pesava mais de 180 quilos, no troca troca dos canais, ele comia um pouco para passar o tédio. Foi tanto tempo fugindo de tudo, que uma manta de gordura o separava do mundo, o separava até mesmo da televisão. E para ele bastava estar com o controle na mão e ir mudando. Com TV ou sem TV ele é que mandava no controle. Mas ao certo não sabia quem era, nunca tinha nem parado para pensar. Adoçava a vida com muito açúcar, dos mais diversos tipos, confeitos, sorvetes, bolos, etc. Balanceava o doce com um salgado, afinal como adoçar as amarguras se já está se sentindo doce ao extremo?
Fabio nunca parava, nunca olhava seus olhos no espelho, não compreendia a si. Não compreendia e nem tentava. Apenas comia.
Mas até os psiquismos mais inconscientes sentem dor. E na calada da noite, ele chorava. Chorava igual a um gatinho que quer deitar com seu dono em uma noite fria. Ele miava, porque chorar mesmo ainda não tinha aprendido.
Seu controle e seu miado. A única partícula de vida que sempre lhe dizia: você está aqui e Não há escapatória. Assim ele miava mais um pouco. Sentia seu estômago inchado de tanta comida e não sabia o que fazer. Miava, Miava, Miava. Ultimamente Miava em letra maiúscula.
quinta-feira, 16 de janeiro de 2014
Às favas! (texto chato de ler e escrever, texto óbvio, mas que eu precisava escrever)
O nome dele é Luis. Luis é um homem de esquerda, sempre foi ligado às questões de seu partido e resolveu estudar ciência política porque queria ajudar as causas políticas que acreditava. Além desse histórico de pessoa preocupada com o que acontece "no partido", ele se mostrou completamente repartido, entre fala e ação. Mas isso eu falo depois. Além do que vou falar depois, Luis é DIRETOR, sim, sim, ele é o diretor do clubinho do leitor da escola de seu filho.
Abre parenteses.
Como funciona o clubinho do leitor?
O clubinho do leitor fica na casa do Luis, ele ocorre mais precisamente na biblioteca da casa do Luis. Lá tem muuiiitos livros, e dentre esses muitos são infantis. Três vezes por semana os alunos da escola onde o filho do Luis estuda, vão até a casa de Luis para pegar livros emprestados e contar sobre os livros que leram durante a semana. Então acontecem seminários, segundas são as séries iniciais, quartas as séries intermediárias, e sextas as séries finais... no decorrer eu falo mais sobre a diretoria do clubinho.
Fecha parenteses.
Então, além de diretor do clubinho o Luis também é funcionário de um supermercado, ele é empacotador por escolha. Acreditem se quiserem, nesta estória as pessoas escolhem ser empacotadoras porque trabalhar em hipermercado é muito importante e existe até concurso para isso, então o Luis apesar da ciência política, estudou com afinco para ser funcionário do hipermercado e "se deu bem", fez a escolha do salário garantido.
Eu sou eu, estava na rua sentada no banco da praça, pensando porque as mulheres não possuem a cultura de fumar cachimbo e os homens estão a perdê-la. Pensando, pensando e pensando. O Luis chegou, sentou a meu lado e me falou assim:
Estou no intervalo do hipermercado, sou empacotador. Você nem me conhece, nem faço questão que me conheça, estou conversando com você porque este é o único banco da praça e sentar ao seu lado e não falar absolutamente nada ficaria muito chato, então quero lhe dizer que não sou do tipo de fazer algo para parecer chato, desse modo eu sigo o protocolo, mesmo sem ter vontade de conversar com você (detalhe, Luis não percebeu que falar assim também ficava chato, e foi um bunda mole por não assumir sua postura, e cometeu o ato falho de escapar sua postura pela fala, pobre Luis, tanta vontade de seguir o protocolo...).
Não falei nada, porque não quis, e ponto.
Luis voltou a falar, me disse que estava cansado no supermercado, que lá tinham muitas pessoas e que tudo era estressante: tinha que empacotar 200 sacolas e 10 min., separar as sacolas por tipo de alimentos e produtos de higiene e limpeza, além de ter que falar com os colegas, ter que falar com os clientes, e ter um supervisor de função sempre no seu pé, e um chefe (DIRETOR) que esporadicamente entrava em contato apenas para fazer cobranças.
Continuei quieta.
Luis então me contou do clubinho da leitura. Disse que no início do ano fazia a lista dos livros que cada aluno deveria ler, organizava a ordem dos seminários onde estava incluso o tempo de apresentação e uma avaliação de clareza e dicção. Todos tinham que corresponder as expectativas de Luis, caso contrário, ficariam suspensos do clubinho (talvez todos quisessem ser suspensos), porém junto da suspensão o Luis conseguiu um modo de a mesma diminuir a média do aluno e este poderia até rodar de ano (pobre Luis, utilizando esses mecanismos de controle, boicotando a criatividade e a autogestão e...).
Não me contive e perguntei:
Tu faz alguma coisa a respeito do teu trabalho?
O mais rápido possível ele me responde: claro que faço, sou filiado ao partido, e lá aprendi pelos meus direitos e então sempre faço passeatas, faço greve, arranjo pessoas para se unirem à causa.
POBRE LUIS, NÃO RENUNCIA A DIREÇÃO NEM POR UM MINUTO, AMA O PODER, E NÃO SABE FAZER NADA DIFERENTE DO QUE REPRODUZIR O AUTORITARISMO QUE ESTÁ INSTITUCIONALIZADO NELE PRÓPRIO, mas o pior é que ele não pode deixar ficar chato, então ele nega pra todo mundo através de seu envolvimento com a política e as causas trabalhistas (mais uma vez suas ações representam o ato falho e a bunda do Luis deve ser bem mole mesmo).
Luis acorda: você não briga com seu emprego, a briga é contigo mesmo.
Luis foi embora, disse tiau para não ficar chato.
Abre parenteses.
Como funciona o clubinho do leitor?
O clubinho do leitor fica na casa do Luis, ele ocorre mais precisamente na biblioteca da casa do Luis. Lá tem muuiiitos livros, e dentre esses muitos são infantis. Três vezes por semana os alunos da escola onde o filho do Luis estuda, vão até a casa de Luis para pegar livros emprestados e contar sobre os livros que leram durante a semana. Então acontecem seminários, segundas são as séries iniciais, quartas as séries intermediárias, e sextas as séries finais... no decorrer eu falo mais sobre a diretoria do clubinho.
Fecha parenteses.
Então, além de diretor do clubinho o Luis também é funcionário de um supermercado, ele é empacotador por escolha. Acreditem se quiserem, nesta estória as pessoas escolhem ser empacotadoras porque trabalhar em hipermercado é muito importante e existe até concurso para isso, então o Luis apesar da ciência política, estudou com afinco para ser funcionário do hipermercado e "se deu bem", fez a escolha do salário garantido.
Eu sou eu, estava na rua sentada no banco da praça, pensando porque as mulheres não possuem a cultura de fumar cachimbo e os homens estão a perdê-la. Pensando, pensando e pensando. O Luis chegou, sentou a meu lado e me falou assim:
Estou no intervalo do hipermercado, sou empacotador. Você nem me conhece, nem faço questão que me conheça, estou conversando com você porque este é o único banco da praça e sentar ao seu lado e não falar absolutamente nada ficaria muito chato, então quero lhe dizer que não sou do tipo de fazer algo para parecer chato, desse modo eu sigo o protocolo, mesmo sem ter vontade de conversar com você (detalhe, Luis não percebeu que falar assim também ficava chato, e foi um bunda mole por não assumir sua postura, e cometeu o ato falho de escapar sua postura pela fala, pobre Luis, tanta vontade de seguir o protocolo...).
Não falei nada, porque não quis, e ponto.
Luis voltou a falar, me disse que estava cansado no supermercado, que lá tinham muitas pessoas e que tudo era estressante: tinha que empacotar 200 sacolas e 10 min., separar as sacolas por tipo de alimentos e produtos de higiene e limpeza, além de ter que falar com os colegas, ter que falar com os clientes, e ter um supervisor de função sempre no seu pé, e um chefe (DIRETOR) que esporadicamente entrava em contato apenas para fazer cobranças.
Continuei quieta.
Luis então me contou do clubinho da leitura. Disse que no início do ano fazia a lista dos livros que cada aluno deveria ler, organizava a ordem dos seminários onde estava incluso o tempo de apresentação e uma avaliação de clareza e dicção. Todos tinham que corresponder as expectativas de Luis, caso contrário, ficariam suspensos do clubinho (talvez todos quisessem ser suspensos), porém junto da suspensão o Luis conseguiu um modo de a mesma diminuir a média do aluno e este poderia até rodar de ano (pobre Luis, utilizando esses mecanismos de controle, boicotando a criatividade e a autogestão e...).
Não me contive e perguntei:
Tu faz alguma coisa a respeito do teu trabalho?
O mais rápido possível ele me responde: claro que faço, sou filiado ao partido, e lá aprendi pelos meus direitos e então sempre faço passeatas, faço greve, arranjo pessoas para se unirem à causa.
POBRE LUIS, NÃO RENUNCIA A DIREÇÃO NEM POR UM MINUTO, AMA O PODER, E NÃO SABE FAZER NADA DIFERENTE DO QUE REPRODUZIR O AUTORITARISMO QUE ESTÁ INSTITUCIONALIZADO NELE PRÓPRIO, mas o pior é que ele não pode deixar ficar chato, então ele nega pra todo mundo através de seu envolvimento com a política e as causas trabalhistas (mais uma vez suas ações representam o ato falho e a bunda do Luis deve ser bem mole mesmo).
Luis acorda: você não briga com seu emprego, a briga é contigo mesmo.
Luis foi embora, disse tiau para não ficar chato.
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